quinta-feira, 19 de maio de 2011

Educação financeira - O valor do centavo


Nos meios políticos e empresariais muito se fala em reformas econômicas, redistribuição de renda, combate a pobreza, e outros temas igualmente impactantes para a população porém, o que se faz a respeito?
As reformas econômicas - lentas e desgastantes, acabam acontecendo por inércia, e sempre é levada a cabo pelo próprio mercado, com as empresas correndo para atender a demanda e preservar a sua fatia.
Já a redistribuição de renda ocorre a passos largos - retira-se renda da classe média através da alta tributação e redistribui-se para os mandatários de plantão, através de uma roubalheira desenfreada e escandalosa.
Quanto ao combate a pobreza - bem ele acontece. Na mídia! E quase sempre por meio de campanhas publicitárias caríssimas que seriam cômicas se não fossem tristes.
Uma reforma econômica que não venha lado a lado com uma reforma tributária é tão inócua que não vale a pena consumir tempo precioso analisando o tema.
Falar em redistribuição de renda sem rever e desonerar a folha de pagamento das empresas - retirando das mãos do governo a montanha de recursos daí decorrente, e sem um planejamento sério de revalorização do salário mínimo - dando-lhe real poder aquisitivo, é pura piada!
Há, no entanto, um caminho para o qual até agora não se deu a devida atenção e, se for levado em conta, pode se tornar o motor da verdadeira revolução em benefício do povo brasileiro.
Pesados, constantes e seletivos investimentos em educação priorizando a base, apoiando o intermediário e incentivando o superior. Nesta ordem!
Isto feito, é certo que - no mais tardar em uma década, teremos uma geração de cérebros intelectualmente desenvolvidos a ponto de dar valor àquilo que somente os mais esclarecidos - ou mais espertos, já descobriram: A educação financeira!
Atualmente, vemos através da mídia - sempre ela, que políticos, atletas, artistas e celebridades em geral ganham - em pouquíssimo tempo, verdadeiras fortunas.
O efeito mais deletério disso é que incuca nas pessoas a idéia errônea de que estudar e se qualificar deixou de ser o caminho para a prosperidade, e isso está apodrecendo a sociedade.
Como consequencia desse apodrecimento, é comum ver adolescentes sonhando com a fama e líderes comunitários sonhando com altos cargos, mesmo sem saber sequer se expressar ou escrever no próprio idioma.
E, para piorar, esses pobres desqualificados sonham com milhões, deixando de lado o princípio básico de que se deve sempre valorizar o que se tem.
Em se tratando de dinheiro esquecem que, antes antes do milhão vem o milhar, que antes deste vem a centena, que antes desta vem a dezena, e antes da dezena vem a unidade, e que antes da unidade vem o pobre e desvalorizado centavo.
Claro que há - e sempre haverá, os espertalhões que disso se beneficiam, e aqui entramos no mérito da questão. Quanto vale um centavo?
Imerso nessa questão e por três meses seguidos, observei e conversei com centenas de consumidores e de caixas de padarias, farmácias, casas lotérias e supermercados.
A minha conclusão foi acachapante. Está se efetivando um lento e lucrativo processo de transferência de renda dos consumidores - ricos e pobres, para os comerciantes, que enriquecem cada vez mais.
Explica-se. Não há uma pessoa sequer que se disponha a reclamar e a exigir que, na hora do pagamento, não se faça aquele eterno 'arredondamento' no qual R$ 2,98 vira R$ 3,00 ou R$ 10,46 vira R$ 10,50.
Todos declaram ficar 'constrangidos, evergonhados e temerosos' de serem taxados de avarentos, e acabam aceitando bovinamente o roubo descarado.
Para ilustrar melhor a colocação, decidí tomar como referência um supermercado - cujo gerente aceitou falar sob a condição de anonimato.
Trata-se de uma loja de aproximadamente 800 metros quadrados, com 8 caixas, localizada em um bairro classe média da capital paulista, frequentado por pessoas das classes B, C e D.
O fluxo diário de consumidores gira em torno de 1.000 pessoas por caixa, portanto 8.000 por dia trinta dias por mês.
São 240.000 pessoas a cada mês e 2.880.000 pessoas a cada ano. Uma multidão não é? Segundo o nosso gentil gerente, o valor médio do tíquete de compra por consumidor gira em torno de R$ 11,00.
Tomemos agora como média aceitável de que cada cliente deixa nos caixas apenas e tão somente R$ 0,03 centavos por conta do tal arredondamento. O que temos?
Temos que os consumidores deixaram em um ano 'apenas' R$ 86.400,00 (oitenta e seis mil e quatrocentos reais ou quase 159 salários mínimos em valores atuais), para engordar as receitas de apenas uma loja de apenas uma rede de supermercados de apenas um bairro de apenas uma das cidades brasileiras.
Pela cultura vigente um centavo nada vale, e deixar que se arredonde três míseros centavinhos na conta em nada afeta cada consumidor individualmente, mas para os comerciantes, é um maná!
Basta projetar isso em termos de redes varejistas, de cidades, de estados e de país, e veremos que temos sim, uma silenciosa e monumental transferência de renda dos consumidores para os comerciantes, e feita centavo a centavo, silenciosamente.
Se e quando os governos derem a devida atenção à educação - valorizando a educação financeira e dando ao povo formação e condições para entender essas questínculas, impedir-se-á que espertalhões levem vantagem, e se beneficiem materialmente da ignorância coletiva.
Muitos deixando para poucos um pouquinho de cada um nem dói né? Mas poucos, tirando de muitos um pouquinho de cada um sem que sequer percebam, constroem fortunas enquanto a maioria segue sonhando, e se deixando roubar.